O Fim de uma Era: O Legado e as Interpretações do Final de Era Uma Vez no Oeste

O filme Era Uma Vez no Oeste (Once Upon a Time in the West, 1968), dirigido por Sergio Leone, é um épico do western que transcende a narrativa tradicional do gênero. Seu final, repleto de simbolismo, tem sido amplamente debatido pelos fãs e críticos.

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As interpretações variam entre uma visão pessimista do avanço da modernidade e uma perspectiva mais esperançosa sobre a construção de uma nova sociedade. A seguir, exploramos algumas dessas leituras e como elas se conectam com os temas centrais do filme.

O Declínio do Velho Oeste

A leitura predominante entre os fãs sugere que Era Uma Vez no Oeste trata do fim do Velho Oeste e da transição para uma nova era. A ferrovia simboliza o progresso inevitável, trazendo consigo uma mudança irreversível na paisagem social e econômica. Personagens como Frank e Harmonica representam relíquias de um mundo em extinção, incapazes de se adaptar à nova realidade. O próprio título do filme reforça essa ideia: Era Uma Vez no Oeste fala de um tempo que já passou, evocando nostalgia e fatalismo.

Essa transição é evidenciada nos diálogos finais do filme. Frank, um atirador brutal que tenta se tornar um homem de negócios, percebe que o novo mundo não tem espaço para ele. Em sua última conversa com Harmonica, ele admite: “O futuro não importa para nós”. A morte de Frank simboliza a queda do Velho Oeste dominado pela força bruta, enquanto a saída de Harmonica reforça que ele também não pertence ao novo mundo em formação.


O Papel de Jill McBain e a Esperança no Futuro

Enquanto Frank e Harmonica representam um mundo moribundo, Jill McBain encarna a continuidade e a resiliência. No final do filme, ela traz água para os trabalhadores da ferrovia, um gesto que simboliza a construção de uma nova comunidade. Diferente dos homens violentos que dominaram o Velho Oeste, Jill assume um papel de liderança na transição para uma sociedade mais estruturada.

Essa interpretação sugere que Era Uma Vez no Oeste não é apenas um epitáfio para o western tradicional, mas também uma narrativa sobre o nascimento de um novo mundo. Jill representa um tipo de progresso humano, não apenas tecnológico. Enquanto Morton via a ferrovia como um meio de acumular riqueza e poder, Jill vê nela uma oportunidade para criar um lar e uma sociedade mais unida.


O Conflito Entre Anarcocapitalismo e Capitalismo Liberal

Outra leitura interessante sugere que o filme explora a transição do anarcocapitalismo violento para um capitalismo liberal estruturado. No Velho Oeste, o poder pertencia aos indivíduos mais fortes e impiedosos, como Frank. Entretanto, com o avanço da civilização, o domínio passa a ser exercido por aqueles que controlam os meios de produção e a infraestrutura, como Morton e sua ferrovia.

Contudo, Morton, que deveria representar a modernidade capitalista, não sobrevive ao confronto com Frank. Isso sugere que a violência ainda desempenha um papel fundamental na transição entre sistemas de poder. No entanto, o destino final de Frank prova que mesmo os senhores da guerra do anarcocapitalismo estão fadados à extinção diante da nova ordem econômica.

O filme ilustra essa mudança ao mostrar que a dominação passa a ser exercida não apenas pela força bruta, mas por meio da posse dos recursos e da infraestrutura. Em um mundo onde a ferrovia é essencial para a sobrevivência econômica, o verdadeiro poder está nas mãos de quem controla esse recurso, e não de quem empunha a arma mais rápida.


A Morte Como Destino Inevitável dos Pistoleiros

Uma das cenas mais icônicas do filme é o duelo entre Frank e Harmonica. Muitos fãs interpretam esse momento como um confronto inevitável entre dois homens que pertencem a um passado moribundo. A luta entre eles não é apenas uma questão de vingança, mas também uma forma de reafirmar sua existência em um mundo que já os descartou.

Harmonica, ao contrário de Jill, não pode fazer parte da nova sociedade. Ele é um homem do passado, guiado por sua necessidade de vingança e pela violência que o define. Sua saída solitária no final do filme reforça a ideia de que os pistoleiros não têm lugar na nova civilização. Ele executa sua missão, mas sabe que não pode permanecer. Assim, Era Uma Vez no Oeste reforça que a modernidade não apenas substitui os velhos ícones do western, mas os torna irrelevantes.


A Mitologia do Western e o Fim de uma Era

Para muitos fãs, o final do filme não trata apenas da morte do Velho Oeste histórico, mas também do fim do western enquanto gênero cinematográfico. Leone, que ajudou a definir o spaghetti western com Três Homens em Conflito (The Good, The Bad and The Ugly, 1966), parece estar encerrando a mitologia do cowboy solitário e implacável.

O fato de que os três homens que Harmonica mata no início do filme deveriam ser interpretados por Clint Eastwood, Lee Van Cleef e Eli Wallach – ícones do western de Leone – fortalece essa leitura. Essa cena simbolizaria o fechamento de um ciclo, onde os arquétipos clássicos do gênero são eliminados para dar lugar a uma nova visão do western, menos romântica e mais reflexiva.

Conclusão

O final de Era Uma Vez no Oeste é aberto a diversas interpretações, mas sua mensagem central parece clara: o Velho Oeste está morto e um novo mundo está surgindo. Esse novo mundo pode não ser necessariamente melhor ou pior – apenas diferente. Enquanto Frank e Harmonica representam a morte da era dos pistoleiros, Jill McBain simboliza a construção de um futuro baseado na comunidade e no progresso.

Sergio Leone nos entrega não apenas um épico western, mas uma meditação profunda sobre a mudança, o tempo e a inevitabilidade do progresso.

No fim, Era Uma Vez no Oeste não é apenas um filme sobre cowboys e tiroteios, mas uma reflexão sobre o fim de uma era e o nascimento de outra.
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